Brasil de Flato, o blog

quinta-feira, setembro 27, 2007

De mudança


No dia 30 de setembro, eu embarco pra Erfurt, na Alemanha, onde farei um curso de Mestrado em Políticas Públicas, de dois anos de duração.

Pararei de mandar textos para este blog. Mandarei notícias de lá pelo novo blog que criei: http://marcelobritoerfurt.blogspot.com/

quarta-feira, setembro 26, 2007

Por que sou simpático à idéia de se criar um jornalão de esquerda

Nos Estados Unidos, quem acorda de manhã e sai para comprar jornal, tem a opção de escolher entre o esquerdista The New York Times e o direitista The Wall Street Journal. Na França, a escolha é entre o esquerdista Le Monde e o direitista Le Figaro. Mesmo na vizinha Argentina, a imprensa é plural, permitindo a escolha entre o esquerdista Clarin e o direitista La Nacion.
No Brasil, a pluralidade só existe na Internet, de custo fixo quase zero. Não há grande diferença de posições políticas entre os jornais impressos Folha de S. Paulo, o Estado e o Globo, que não se diferem muito da posição da principal rede de TV. Enquanto nas eleições presidenciais dos EUA em 2004 os jornais e as redes de TV se dividiram no apoio entre Bush e Kerry, o pluralismo na grande mídia brasileira nas eleições de 2006 se resumiu na divisão entre os que apoiavam Alckmin porque ele era bom e entre os que apoiavam Alckmin porque ele era menos pior que o Lula.
Isto quer dizer que não existem jornais e revistas de esquerda no Brasil? É óbvio que existem. E muitos: Caros Amigos, Fórum, Brasil de Fato, Hora do Povo etc. O problema é que eles fornecem apenas opinião. Podem eventualmente fornecer informação, mas apenas sobre assuntos de interesse de militantes. Portanto, mesmo esquerdistas como eu, críticos da manipulação da grande mídia, precisam recorrer à Folha, ao Estado e ao Jornal Nacional para obter informação sobre assuntos de interesse geral. A revista Carta Capital é o único periódico de esquerda que sai um pouco da linha opinião-militância pura. Tanto que é o mais influente e o que causa mais irritação na direita. Mas ainda assim, em algumas matérias, a argumentação predomina em espaços que deveriam ser reservados ao predomínio da narração. Porém, de forma menos acentuada do que o Panfleto Semanal de Direita, que só sobrevive como revista voltada ao público geral devido ao respeito conquistado na era do Mino Carta.
Jornalistas de esquerda poderiam pensar em criar um jornal não convencional em conteúdo, mas convencional na forma, com a tradicional divisão de cadernos Brasil-Mundo-Economia-Cultura-Esportes. Em termos de forma, poderiam ser introduzidas algumas pequenas diferenças. O jornal poderia ser um pouco mais simples, mais baratos e com temas de interesse para o trabalhador braçal. Se os criadores deste suposto jornal não conseguirem apoio de uma grande empresa, poderiam trabalhar em cooperativa. E tentar conseguir dinheiro de sindicatos (de vários, para evitar partidarização).
Mercado para um jornal de esquerda existe. Embora a classe média esteja mais conservadora hoje do que há uma década, ainda hoje há um número absoluto grande de pessoas com renda para comprar um jornal e produtos nele anunciados que teriam interesse em ler uma publicação com posições de esquerda, ou pelo menos de centro-esquerda. Na verdade, há uma demanda reprimida por este tipo de produto, que se direciona para a Folha de S. Paulo, um jornal não-esquerdista que possui pluralidade interna um pouco maior que os demais jornais. O próprio Bispo Edir Macedo descobriu este mercado potencial. A Record tem um programa apresentado pelo Paulo Henrique Amorin.
A partidarização da grande mídia brasileira
Quem leu este texto do início, pode ter perguntado "New York Times de esquerda? NYT é menos esquerdista que alguns jornais brasileiros". Pode até ser. Mas o NYT costuma apoiar o Partido Democrata, o partido mais à esquerda no espectro local (mesmo não sendo no espectro global). Aqui no Brasil, todos os principais jornalões e revistonas estão mais próximos da dupla PSDB-DEM, ou seja, a principal força de direita no nosso espectro político.
Isto não quer dizer que a grande mídia no Brasil seja um veículo de propaganda do PSDB-DEM. Na verdade, os grandes jornais e revistas viraram um partido próprio, sendo chamado de PM (Partido da Mídia) ou PI (Partido da Imprensa). O PSDB-DEM agem apenas como papagaios do PI. Entre as bandeiras do PI, estão a defesa da ala monetarista da equipe econômica do governo Lula e o ataque ao governo Lula pelos flancos que não sejam o da Economia.
A prova mais concreta da partidarização da grande mídia ocorreu na semana passada. Ali Kamel, o diretor-executivo de jornalismo da Globo, escreveu um artigo denunciando a doutrinação marxista às nossas crianças por um livro didático, e no dia seguinte, a Folha e o Estado endossaram o coro de forma acrítica, sem mencionar o fato que o turcudenista simplesmente selecionou os trechos do livro que eram favoráveis à sua tese. O livro escolar em questão tinha visão marxista de história (historiador marxista?, não diga), mas não fazia apologia a Mao-Tse Tung, como Ali dizia. Além disso, o artigo deu a entender que o Ministério da Educação havia escolhido o livro, o que não ocorre no Brasil, onde os livros são escolhidos pelos próprios professores. Ali Kamel simplesmente queria que o MEC censurasse livros.
Papagaiando o PI, o deputado Paulo Renato endossou o coro dos indignados contra a doutrinação gramsciana de nossas crianças. Esqueceram-no de avisar que este livro foi escolhido durante sua gestão no Ministério.
Um jornalão de esquerda poderia responder às iniciativas autoritárias de "defensores da liberdade".

terça-feira, setembro 18, 2007

Como são produzidos os debates de disco riscado

Um debate fica sem solução, com cada um dos lados repetindo chavões que não respondem os argumentos do adversário, quanto todos os participantes decidem enxergar da realidade apenas os fragmentos que os interessam. Neste caso, os dois lados podem ser antagônicos e estarem ambos certos em sua interpretação parcial da realidade.
Um bom exemplo disso ocorre quando um casal vai para um restaurante, o homem come apenas as carnes, e a mulher come apenas as saladas. Se as carnes estão muito boas e as saladas, muito ruins, o homem vai falar que o restaurante é bom e a mulher vai falar que é ruim. Embora tenham opiniões divergentes sobre um mesmo objeto, neste caso, o restaurante, é muito difícil um refutar o outro, pois ambos estão corretíssimos em suas interpretações das partes que lhes interessam, neste caso, a carne para um e a salada para a outra. A discussão entre ambos seria um disco riscado: a carne estava boa, mas a salada estava ruim, mas a carne estava boa...
No debate político temos alguns exemplos clássicos. Um deles se refere à comparação entre os países da Ásia com os da América Latina. A realidade é: os primeiros apresentam pesada intervenção estatal (com exceção de Hong Kong) no sentido de promover uma indústria competitiva com alto conteúdo tecnológico e manter o câmbio estável, mas a maioria dos países asiáticos não apresenta grande estrutura de proteção social. Os países asiáticos apresentaram elevadas taxas de crescimento nos últimos anos. Os segundos tentaram se industrializar a partir dos anos 30 através da substituição de importações, uns foram bem sucedidos (Brasil, México), outros não. Governos populistas contruíram uma razoável estrutura de proteção social. Após 1989, os países latino-americanos adotaram políticas neoliberais, e no caso do Brasil, foi amplicada a rede de proteção social como forma de compensação. Nos últimos anos, a América Latina apresentou baixas taxas de crescimento. Como funciona este debate de disco riscado? Simples: a esquerda atribui as altas taxas asiáticas de crescimento à elevada intervenção estatal e as baixas taxas latino-americanas de crescimento à adesão do continente ao Consenso de Washington. Enquanto isso, a direita atribui o alto crescimento asiático à inexistência de uma grande rede de proteção social e ao direcionamento das economias para a exportação, e o baixo crescimento latino-americano à existência de maior proteção social e à industrialização por substituição de importações.

quinta-feira, setembro 13, 2007

Paralelo: clubes de futebol - bandas de rock

Um e-mail que anda circulando. Os dois últimos são contribuições minhas:

BOTAFOFO = ROLLING STONES
Seria o maior na década de 60, se não houvesse os Beatles, ou o Santos.Teve em "Satisfaction" o seu Garrincha, mas hoje vive como uma sombrado que foi há 40 anos. Recentemente tocou junto com Justin Timberlake,o que representou uma queda de divisão. Porém, ao tocar com o AC/DC,deu a volta por cima e retornou à elite.

VASCO = OASIS
É meio sem graça, mas fez bastante sucesso nos anos 90 conseguindograndes feitos. Famoso pelas sandices do seu frontman Eurico Gallagher,hoje em dia ainda consegue uns lampejos de sucesso. Mas continua sem graça.

FLAMENGO = METALLICA
Foi rei nos anos 80. A era Zico, ou Master of Puppets, foi marcante nahistória e até os desafetos reconhecem. Dos anos 90 em diante,conseguiu ainda bastante fama, embora seja visível que ao longo dosanos só tem piorado.

FLUMINENSE = STONE ROSES
É uma bandinha legal. Ninguém odeia. Costuma ter certo prestígio entrecríticos musicais/esportivos, mas, embora famosa na Inglaterra, fora dopaís ninguém conhece. Resumindo, é uma bandinha simpática.

SÃO PAULO = QUEEN
A banda já foi eleita a melhor do mundo uma quantidade razoável de vezes.No entanto, mesmo com grande sucesso e feitos históricos, o que chamagrande atenção no grupo é uma tendência um tanto quanto afeminada, nãose sabendo exatamente se é elegância ou uma atitude "bambi" de ser.

SANTOS = BEATLES
Na década de 60, o conjunto era talvez o melhor que já existiu. Teveconfrontos lendários contra os Rolling Stones - Botafogo - masnormalmente levava a melhor.Enquanto metade da banda já se foi, os Stones estão na ativa até hoje. Esse é o único ponto em favor do Botafogo talvez explique sua vitóriaem 95.

PALMEIRAS = AEROSMITH
Muito sucesso no passado, depois ficou de lado por um bom tempo... daífez uma parceria com a Parmalat-Run-DMC e voltou ao destaque, semantendo nele por um tempo. Chegou até perto do topo do mundo, mas nãoteve sorte. Agora voltou a ficar de lado.

CORINTHIANS = LINKIN PARK
Embora nunca tenha conseguido nenhum grande feito em sua história, temuma legião de fãs, fiéis e chatos. Ao mesmo tempo, tem uma quantidadeenorme de gente que odeia. Talvez a única vez que consiga ser o melhordo mundo seja em mundiais fajutos como o de 2000 mesmo.

BRAGANTINO = NIRVANA
Muito sucesso no início dos anos 90, terminou em 1994.

SÃO CAETANO = STROKES
Foi um hype no início do sec XXI, tido como a nova sensação, a salvação do futebol /rock, cultuado pelo público mais alternativo e de renda mais alta. Mas declinou, e pode cair no ostracismo.

terça-feira, setembro 11, 2007

A Arábia Saudita é aqui

Em Riad, na Arábia Saudita, a temperatura costuma passar dos 40 graus, mas as mulheres andam em público sempre cobertas por panos, devido às imposições religiosas, de Alá.
Faz calor em Campinas desde fins de agosto. As máximas costumam beirar os 30 graus. Mas cadê as pernas femininas? Ainda escondidas por trás dos jeans. Por enquanto, saias são utilizadas apenas justamente por religiosas, as evangélicas neopetencostais, vulgarmente conhecidas como crentes. Tais saias costumam ser menos sexy do que as burcas das muçulmanas. As demais moças costumam andar com seus inseperáveis jeans, talvez devido também a motivos religiosos: consideram pecado mostrar um pouquinho de celulites, varizes, vasos, gorduras ou simplesmente pele muito branca. Muitas preferem tirar a saia, o vestidinho ou o short do armário somente depois de academia ou de sol. Isto é triste, pois pernas não precisa de perfeição total para serem sexy. É claro que há exceções, mas muitas vezes vi meninas que andavam diariamente de calça comprida, e no dia que decidiram mudar um pouco a rotina, revelaram que nenhum defeito havia em seus membros inferiores.
Nos meus tempos de faculdade (2002-2006), as salas costumavam ter 35 alunos. Com uma proporção 60:40, havia normalmente 14 meninas por sala. Em cinco anos de curso, não me lembro de um único dia sequer ter visto mais de 5 meninas em uma mesma sala que não estivessem usando calça comprida. Mesmo nos meses letivos mais quentes, como março, abril e novembro. Digo 5 incluindo ainda aquela com a maldita bermuda. Nos meses um pouquinho mais frios, quando as máximas atingiam "apenas" 25, o número de meninas sem calça costumava ser zero. Enquanto isso, a maioria dos rapazes ainda insistiam no uso da bermuda, mesmo em temperaturas moderadas. Tento imaginar minhas colegas de sala naqueles filmes de anos 40, que mostram mulheres de casacos longos e saias que terminam um pouco depois do joelho. Estariam todas mudas, de tanto bater o queixo de frio.
O século XX foi paradoxal. Enquanto encurtou as saias das mulheres, difundiu o uso da calça comprida para elas. O encurtamento das saias não foi um processo linear. As barras subiram e desceram, mas sempre com tendência para cima. Nos anos 20, as saias subiram para quase a altura do joelho. Em 1929, caíram como os preços das ações. Perto do início da Segunda Guerra Mundial, subiram de novo. Nos anos 50, desceram um pouquinho. Nos anos 60 subiram de vez. O ano 1965 foi o símbolo do paradoxo: foi o ano da minissaia e o ano em que a produção européía de calças femininas superou a de saias. No início, não se tratava de um paradoxo, porque assim como uma saia curta, a calça feminina era vista como uma coisa sexy. Hoje não é mais.
Apesar do título do texto, que escolhi para ser chamativo, o paralelo ideal que deve ser feito não é com a Arábia Saudita, e sim com a Roma Antiga. Lá, os homens usavam saia curta e as mulheres, saia comprida. Hoje, entre os jovens, os homens usam calça curta e as mulheres calça comprida.

domingo, agosto 26, 2007

Provocação aos monetaristas

Todos os economistas conhecem a fórmula MV=PY (M=quantidade de moeda, V=velocidade, P=nível de preços, Y=produto). Para a Teoria Quantitativa da Moeda (base para os monetaristas) V e Y são constantes. V é determinado por hábitos dos indivíduos e não tende a mudar muito bruscamente, e Y de longo prazo é determinado pelo capital, trabalho e tecnologia, sem relação com a quantidade de moeda. M é determinada pela autoridade monetária (normalmente o Banco Central) e com V constante, uma variação de M tem efeito sobre Y no curto prazo e no longo prazo, apenas em P.
Normalmente discute-se os impactos de um aumento de M.
Pergunto o oposto: de acordo com a TQM, uma redução de M reduziria primeiro Y, mas depois dos agentes ajustarem suas expectativas, o efeito de longo prazo seria apenas a redução de P. Quer dizer que se o BC cortasse a quantidade de moeda até chegar no zero, o nível de preços seria zero? Se o BC fizesse isso, todos os bens e serviços seriam gratuitos?

Obs. Postei isso na comunidade "Economia Brasileira". Aguardo respostas.

sexta-feira, agosto 10, 2007

40 anos: The piper at the gates of dawn

Neste ano, são muito bem lembrados os 40 anos do Sgt Peppers. Mas poucas referências foram feitas aos 40 anos de outra obra produzida nos estúdios da Abbey Road: The Piper at the gates of Dawn, o primeiro álbum do Pink Floyd lançado em 5 de agosto de 1967. É um álbum conceito, assim como o Sgt Peppers. O álbum do Pink Floyd seria algo como um irmão mais novo desconhecido do álbum dos Beatles.
O Piper não fez muito sucesso quando foi lançado. O Pink Floyd começou a ganhar mais visibilidade apenas a partir de 1971, com o Meddle, para arrebentar em 1973 com o Dark Side of the Moon e se manter no auge com Wish You Were Here, Animals e The Wall. The Piper at the Gates of Dawn, por ser basicamente inteiro do Syd Barret, que saiu da banda logo depois, é bem diferente dos sucessos do Pink Floyd dos anos 70. É do estilo psicodélico, tem músicas mais curtas, e algumas delas, como Lucifer Sam, são mais "animadinhas" do que normalmente é conhecido o Pink Floyd pelas suas obras posteriores. A única faixa longa, repleta de solos longos, é a instrumental Interstellar Overdrive. As demais são cantadas, quase todas por Syd, e tratam de astros e contos de fada. A única canção que Syd Barret não compôs foi Take up the stethoscope and walk, de Roger Waters. Foi a mais fraquinha (ou a menos boa) do álbum, assemelhando-se com um rockzinho indie atual. A única faixa conhecida dos não-conhecedores profundos de Pink Floyd é Astronomy Domine (a primeira do álbum) devido ao fato dela ter sido apresentada no Pulse.
Apesar da fase de maior sucesso do Pink Floyd ter sido os seis álbuns lançados nos anos 70, considero o The piper at the gates of dawn o terceiro melhor álbum da história da banda, atrás obviamente de Dark Side of the Moon e The Wall. E para mim, a distância do primeiro para o segundo é maior que a do segundo para o terceiro.